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Inclusive.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT) NORMA BRASILEIRA DE ACESSIBILIDADE – 2015
NBR 9050/2004 x NBR 9050/2015. O que mudou?
Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos: de 2004 a 2015
Por Regina Cohen*
Depois de muita ansiedade dos profissionais que se dedicam ao estudo da acessibilidade, especialistas ou não, das associações de Pessoas com Deficiência, de Núcleos e Laboratórios nas Universidades e da militância de muitos que tem dedicado grande parte de seu tempo ou de sua vida pela “acessibilidade para todos”, a nova NBR 9050 finalmente saiu e foi publicada pela ABNT no mês de setembro deste ano de 2015.
Parabenizo o Comitê Brasileiro Organizador (ABNT/CB-040) pela perseverança e por sua composição com pessoas engajadas no assunto e cientes da urgência de se construir um documento que atenda à realidade brasileira. Nosso desafio a partir de agora, com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, com a Lei Brasileira de Inclusão e com esta norma, é inevitavelmente ir mais adiante, fazendo cumprir as mais avançadas leis, decretos, convenções e normas, construindo um Brasil mais Acessível, no seu sentido pleno. Tenho algumas dúvidas fundamentais:
1. Por que, apesar de todo o avanço na legislação sobre acessibilidade, o Brasil ainda não possui, verdadeiramente, “cidades universais”?
2. Onde estamos errando?
Gosto de pensar como Jaime Lerner quando coloca a questão de certas cidades conseguirem fazer transformações positivas e também pensar como este arquiteto brasileiro quando diz que em todas as cidades inovadoras e de vanguarda se iniciou um começo, um despertar. É o que faz uma cidade reagir (Jaime Lerner. Acupuntura Urbana. 2005: 7,8).
Nos anexos da nova norma brasileira de acessibilidade, está o conceito de desenho universal e seus princípios e a consideração de fatores relevantes de projeto, como o detalhamento de barras de apoio, e o sanitário para uso da pessoa ostomizada. O novo texto evoluiu muito no sentido de ser mais explicativo e de detalhar um pouco mais a informação, o uso da sinalização tátil e visual no piso, a inclusão da Língua Brasileira de Sinais, dentre outros fatores que abandonam uma abordagem cartesiana de só enfatizar a acessibilidade arquitetônica e urbanística.
Fico feliz com o fato de o conceito do desenho universal fazer parte de forma mais ampla na norma brasileira, levando em consideração uma arquitetura e um design mais inclusivos e“centrados no ser humano e na sua diversidade” (NBR 9050/2015, p.139). Os princípios do desenho universal, discutidos e debatidos há alguns anos atrás por profissionais em diversas universidades americanas e também por especialistas na área foram incorporados no primeiro anexo da norma, sendo um conceito tão importante adotado no mundo todo para atender a todos os cidadãos da urbe.
Creio que se tentou contemplar “as diversas condições de mobilidade e percepção do ambiente”.
Já na própria definição de acessibilidade, antes tão sucinta, acrescenta-se a possibilidade de utilização de “transportes, informação e comunicação, incluindo sistemas e tecnologias, na zona urbana ou rural” (isto não existia na NBR de 2004). Dentre tantos outros conceitos incluídos, também está o de barreira, calçada, calçada rebaixada e muito mais. Todos são fatores essenciais do Plano de Mobilidade Urbana de qualquer cidade.
Para a cadeira de rodas, foi mantido o mesmo módulo de referência de 0,80m x 1,20m, apesar da grande quantidade das motorizadas e das scooters, com dimensões bem maiores. Penso que, nos tempos atuais, estas medidas poderiam ser revistas.
Na parte de circulação e manobra em calçadas, por exemplo, a nova norma incorpora a existência de mobiliários em rotas acessíveis, como eles devem ser planejados de forma a não constituírem- se em barreiras para Pessoas com Deficiência Visual. No que diz respeito a certos itens arquitetônicos: puxadores e maçanetas, por exemplo, há um maior nível de detalhamento. Soma-se a estes a inclusão de controles, comandos, travamento de portas, etc.
Seguindo minha ordem de leitura, foram acrescidos ao novo texto questões de linguagem, contraste e sinais sonoros.
Acrescenta-se ainda que foram introduzidos novos símbolos e desenhos de pessoas obesas, idosas, mulheres grávidas ou com bebê no colo, pessoas cegas com cão guia e pessoas com mobilidade reduzida. A questão da sinalização tátil em corrimãos, pavimento, elevadores, plataformas elevatórias e degraus de escadas foi mantida.
Existe um maior detalhamento de sinalização sonora e a inclusão de sinalização para áreas de resgate para pessoa com deficiência. As rotas de fuga não são esquecidas, mas creio que deveria haver espaço para mais de uma pessoa em cadeira de rodas, como tenho visto em outros países.
Os desenhos aqui são bem mais explicativos.
No caso das rampas, confesso que me surpreendi com a manutenção dos 8,33% como limite. No rebaixamento de calçadas para a colocação de rampas, considerando que é muito acentuada e muitos lugares já avançaram para o limite de 6%. Não concordo que estas rampas sejam feitas em curva e, ainda por cima, com inclinação de 8,33%. A maioria dos países que tenho ido faz o rebaixamento em toda a curva. Gosto muito também das faixas elevadas (trafic calming).
Vagas para Veículos – Sinalização e Tipos de Vagas
O texto está mais claro, mas a retirada dos desenhos é ruim.
Bom, ainda terei que me debruçar muito na nova norma, mas deixo aqui uma linda mensagem de Calvino:
“Não tem nome nem lugar. Repito a razão pela qual quis descrevê-la: das inúmeras cidades imagináveis, devem-se excluir aquelas em que os elementos se juntam sem um fio condutor, sem um código interno, uma perspectiva, um discurso. É uma cidade igual a um sonho: tudo o que pode ser imaginado pode ser sonhado, mas mesmo o mais inesperado dos sonhos é um quebra-cabeça que esconde um desejo, ou então o seu oposto, o medo. As cidades, como os sonhos, são construídas por desejos e medos, ainda que o fio condutor de seu discurso seja secreto, que as suas regras sejam absurdas, as suas perspectivas enganosas, e que todas as coisas escondam uma outra coisa”.
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis. 1993: 44.
* Regina Cohen
Arquiteta, DSc.
Professora Visitante na Universidade de Syracuse, NY, EUA, 2014 (FULBRIGHT/CAPES).
Pós-doutora em Arquitetura (bolsista FAPERJ – PROARQ/FAU/UFRJ). Coordenadora do Núcleo Pró-Acesso da UFRJ.
Bolsista do CNPq com o projeto “Guia de Acessibilidade Plena na Cidade do Rio de Janeiro”.
Bolsista do CNPq com o projeto “Acessibilidade na Copa 2014”.
Participação, como consultora, na Equipe de elaboração do Manual de Acessibilidade para o
Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016.
Consultora em Acessibilidade do Comitê Nacional Organizador da Conferência RIO+20.
Tem experiência em acessibilidade, desenho universal, inclusão, museus, espaços urbanos, universidade e deficiência.
Recebeu prêmio internacional da Associação Européia pelo Ensino de Arquitetura pela melhor metodologia de ensino em 2004. Diversas moções, trabalhos científicos premiados. e livros publicados no tema da “acessibilidade de pessoas com deficiência”.
Contato: arquitetareginacohen@gmail.com